09/07/2018 às 16h25min - Atualizada em 09/07/2018 às 16h25min

13 Reasons Why continua a tratar temas importantes, mas se perde em sua história

Atração se propõe a falar de forma mais ampla sobre cada um dos assuntos que Hanna abordou antes de sua morte

Da Redação: Rafael Barbosa - Foto: Reprodução / Internet
Da Redação: Rafael Barbosa - Foto: Reprodução / Internet

13 Reasons Why chamou atenção em 2017 pela forma como abordava diversos assuntos polêmicos sobre a vida adolescente. Ao falar sobre temas complexos (como bullying e pré-conceito) a trama, que contava os acontecimentos que levaram ao trágico suicídio da jovem Hanna Baker, conseguiu deixa de ser uma “simples série adolescente” para se tornar um importante veículo de discussão sobre a vida estudantil.


Um papel que é abraçado pela atração em sua segunda temporada, que se propõe a falar de forma mais ampla sobre cada um dos assuntos que Hanna abordou antes de sua morte, o que dá a oportunidade para que tópicos delicados, antes foram tratados de forma superficial, agora sejam colocados à frente do debate.

Ambientada alguns meses após a 1° temporada, vemos a mãe de Hanna movendo um processo contra a escola onde a garota estudou, por acreditar que a instituição poderia ter impedido muitos dos acontecimentos que levaram a filha à tirar a própria vida. O processo pede que as pessoas que pertenceram a vida de Hanna e que fizeram parte do seu testamento, retratado em forma de fitas cacetes, preste seu depoimento sobre a jovem e os acontecimentos que levaram ao seu suicídio.

Aqueles que antes foram “acusados” por Hanna, agora passam a senta nos bancos dos réus para falarem as suas versões da história, o que nos ajuda a ter uma visão mais profunda do que foi apresentado no ano passado, além de levar a diante assuntos como aceitação, a pressão e opressão social, violência estudantil, machismo, sexo, entre outros.

A série volta a lidar com muitos dos temas apresentados anteriormente, como bullying, centrado principalmente na figura de Tyler, que já era agredido física e verbalmente na temporada anterior, sendo aqui levado ao seu limite. O personagem ganha mais destaque na trama e juntamente com a ótima performance de Devin Druid, consegue nos mostrar as desventuras de um jovem que apesar, de ter seus desvios de caráter, busca desesperadamente se conectar a alguém enquanto é atacado por todos os lados, inclusive por aqueles que também sofrem bullyng. 

A trajetória de Tyler nos ajuda a ver que, infelizmente, o bullyng não é um ato de um único grupo, como esportistas, e como toda esta pressão social pode ter efeitos drásticos, principalmente em um país onde o acesso a armas é algo corriqueiro. Talvez assustados com a repercussão das cenas fortes retratadas no passado, a atração se acovarde em seus minutos finais, quando dá um desfecho covarde ao arco do jovem, em uma situação que vinha sendo construída deste a primeira temporada. Entretanto, apesar do desfecho pobre, a atração tem um ótimo gancho para sua próxima temporada.



Outros tópicos também voltam a cena, mas retratados de forma diferente, como o suicídio. A série aqui deixa de se focar no que pode causar este tipo de tragédia, para centrar-se na dor sentida por aqueles que ficam para trás, que aqui ganha voz na mãe de Hanna. Ainda passando pelo luto da morte da filha, vemos a personagem tentando entender o que aconteceu a adolescente, remoendo dores passadas e, como alguém que já passou por uma situação semelhante a dela, posso dizer que a série retrata a sua angústia de forma muito sensível e verídica, enquanto também aproveita para falar sobre paternidade.

Até onde os pais conhecem os próprios filhos? Porque os jovens tendem a esconder seus problemas e sentimentos daqueles que os criam? Estas são algumas perguntas feitas pela série, questionamentos que não procuram ser respondidos, mas que geram diálogos interessantes entre os personagens e que trazem uma boa reflexão ao público.

Violência Contra a Mulher
 

Entretanto nenhum tópico é tão debatido quanto o estupro, que se mostra o ponto central desta temporada. Se existem diversas críticas pela forma como a série mostrou de forma explicita cenas de suicídio e violência sexual no seu primeiro ano, agora a atração se sai muito melhor ao abordar este último tema de forma cuidadosa e respeitosa. Hanna é praticamente tirada da equação aqui, o que mostra que embora a jovem tenha sido vítima deste crime hediondo, existem outras inúmeras mulheres que também passaram pela mesma situação e tem que conviver com as marcas desta violência durante toda a vida.

Um exemplo disso é Jesse, que é levada para o centro da narrativa, para que possamos acompanhar os problemas e dilemas que a garota, e outras vítimas de estupro, tem que enfrentar. Claramente abalada e confusa sobre a violência que sofreu, a adolescente tem que lidar com o medo de conviver com seu agressor, mas também com o receio sobre o que as pessoas pensaram dela caso admita que foi violentada, pois sabe que será inevitavelmente julgada por todos aqueles ao seu redor. Uma impressão que não é equivocada, afinal ela tem um exemplo disso na própria figura de Hanna, que mesmo após sua morte é constantemente julgada por suas ações, sendo interessante notar como, apesar dos seus colegas estarem sentados no banco dos réus, durante o julgamento, é a credibilidade da garota que é constantemente colocada a prova.
 

 

Situações complexas e que são tratadas com muita sensibilidade pelo programa, que também acerta em cheio ao abordar o agressor com o mesmo grau de complexidade da vítima.  Bryce é um dos personagens mais importantes deste ano, já que uma abordagem equivocada deste antagonista poderia ser desastrosa para a abordagem e mensagem que a serie quer apresentar.

Seria muito fácil retratar um estuprador apenas como uma figura detestável, vil e que se comporta como um predador sexual toda vez que está perto de uma mulher. A questão é que estupradores tendem a não se comportar de forma tão extrema na maioria das vezes, levando suas vidas cotidianas normalmente, como cidadãos produtivos em seus trabalhos ou estudos, rodeados por amigos e famílias que os apreciam profundamente.

Bryce é o exemplo deste tipo de agressor, tão comum em nossa sociedade, e ao retrata-lo como um jovem inteligente, admirado entre os seus e com um talento nato para liderança, a série mostra que não existe um perfil único para este tipo de criminoso e que ele pode muito bem ser uma figura respeitável da sociedade.

Mas a forma mais interessante na abordagem do personagem é que ele não sabe, pelo menos no início, que é um estuprador. Na mente deste rapaz, claramente corrompido pelo poder e os privilégios que ganhou na vida, ele estava apenas "se divertindo" com suas vítimas, uma concepção comprovada pela própria forma como ele reage ao ser confrontado sobre o crime. O modo como mostra indignação e magoa quando é acusado de estupro em alguns momentos ou quando pergunta para a namorada de forma preocupada se ela sente-se segura perto dele, mesmo que antes a tenha obrigado a fazer sexo com ele, refletem a atitude um uma mente deturpada, que acredita ser uma vítima da situação e que não compreende o mal que fez.



Quem são vocês?

Entretanto, é uma pena que a série não consiga aprofundar seus outros personagens da mesma forma como os assuntos tratados por ela. A forma como Jesse lida com seu problema é retratada de forma muito interessante, porém não conhecemos mais sobre a jovem do que conhecíamos no final da primeira temporada, algo que acontece com a maioria dos outros personagens.

Justin, Alex, Sheri, Karen entre outros podem até ter o seu momento a frente dos holofotes, porém a série não utiliza este tempo para se aprofundar em suas personalidades e  vidas, algo que poderia ser extremamente importante para que pudéssemos entender melhor seus dilemas.
Alguns personagens são exceção a esta regra, como Tyler, Mrs Potter e, principalmente, Hanna. Embora tenha menos tempo de tela nesta temporada, descobrimos muitas coisas sobre a estudante nesta temporada exatamente por não ser ela quem está à frente da narrativa, o que nos dá a oportunidade de conhecer outros lados de sua trajetória por novas perspectivas, mesmo que algumas nos deem informações nada agradáveis sobre a adolescente.

Katherine Langford continua muito bem no papel, esbanjando carisma principalmente quando a série a utiliza através de flashbacks, embora a forma como ela seja inserida junto a Clay, no presente, seja desastrosa por trazer nenhum benéfico a trama e não ser condizente com o clima sóbrio e realista da série.

O que nos leva ao personagem de Dylan Minnette. Clay é sem dúvida o personagem mais mal aproveitado de toda a série, que parece não saber de início o que fazer com o jovem, colocando-o em situações que não levam a lugar nenhum (como um novo relacionamento) ou que demoram muito para serem desenvolvidas (como as misteriosas fotos enviadas a ele). Embora o adolescente seja um dos pontos que impulsionavam a narrativa no passado, a atração lhe tira o protagonismo deixando-o solto e aparecendo em horas pontuais, o que deixa a narrativa perdida já que ninguém é inserido, mesmo que momentaneamente, para assumir o posto de condutor da história.

Quando o rapaz volta ao centro da atração a situação melhora, pois podemos acompanhar de forma mais direta a falta que Hanna faz em sua vida e o modo como a sua morte o afetou, sendo que é na interação dos dois que temos os momentos mais bonitos da série. O luto do jovem, de certa forma, reflete e nossa própria falta de Hanna e a série usa isso de forma inteligente para dar uma despedida digna para a jovem.

13 Reasons Why começa de forma confusa, um erro grave em se tratando de uma série que mantém praticamente o mesmo núcleo de atores, perdendo a oportunidade de explorá-los de forma mais aprofundada, porém ela se encontra conforme os episódios passam, trazendo à tona temas polêmicos e que precisam ser discutidos.

Mesmo perdendo a oportunidade de novamente colocar o dedo na ferida da sociedade, ao abordar os possíveis danos de cultura armamentista americana, a série ainda tem a oportunidade de explorar este e outros assuntos igualmente importantes em seu próximo ano, como gravidez e uso de drogas. Só esperamos que ela o faça de forma mais coerente e narrativamente consistente desta vez.


Link
Notícias Relacionadas »
Comentários »
Comentar

*Ao utilizar o sistema de comentários você está de acordo com a POLÍTICA DE PRIVACIDADE do site https://jeonline.com.br/.